quarta-feira, 22 de junho de 2011

- Coração de Bardo


Chega de poesia, disse o bardo
E lançou fora, como um dardo
Seu despedaçado e maldito coração.
Ah, ilusão infame, enganadora
Que nesta alma apaixonada e sofredora
Encontrou sua morada de paixão.

Houve um tempo em que um poema
Nascia, assim,  qual fosse o tema
Com palavras que surgiam graciosas
Mas na escuridão em que se encontrava
A palavra amiga lhe fugia, abandonava
E a melodia suave, agora lhe era odiosa.

Arranquem-me a cabeça, ele gritou
Arrebatando os cabelos, ao solo se lançou
Como um louco à beira do abismo.
Já não suporto mais a falta de amor
Gritava ele rolando, com olhos de rancor
Desumanidade, desafeto, ódio e cinismo.

Rolou e rolou e quedou cansado
Quase sem fôlego, quase desmaiado
E uma voz fraquinha seu ouvido alcançou.
“Acaso não te seria mais pesado o fardo
Seguir como os outros, não sendo mais bardo
Só porque a inspiração te abandonou?”

Mas uma voz sábia assim merece atenção
O bardo triste voltou os olhos em sua direção
E viu espantado de quem se tratava.
Pois na loucura em que rolava pelo chão
Acabou quedando perto do próprio coração
E viu se tratar dele que a fraca voz emanava.

“Põe me no peito e segue teu destino
Acaso não estamos juntos desde menino
E alguma vez faltei-lhe em precisão?
Não me lances fora, desgraçado
Ignoras que para quem nasce bardo
Pode-se perder tudo: menos o coração?”

E o maldito se deu por vencido
Arrastou-se ofegante, ainda caído
E a mão tremendo tateou e não alcançava
Ele gastara a pouca força que ainda tinha
Arrependeu-se da própria atitude mesquinha
Mas tarde demais: o coração não mais pulsava.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

- The Buke Is On The Table



Em agosto de 1920 nascia na Alemanha, Henry Charles Bukowski Jr, o guri que seria depois conhecido como o poeta escritor Charles Bukowski, o bêbado Henry Chinaski e, na finaleira da vida, o Velho Safado. Bukowski era filho de um soldado americano e logo criança a família se mudou para os EUA. Se criou ali pelo subúrbio de Los Angeles, apanhando por qualquer motivo, saco de pancadas de um pai tão frustrado quanto austero. Na adolescência, fase em que a gente já se acha feio naturalmente, foi atacado por acnes, erupções cutâneas e inflamações que taparam seu rosto e a parte superior do corpo, passando por diversos tratamentos em hospitais públicos. As surras em casa e humilhação no colégio, foram moldando uma personalidade introspectiva e o guri acabou fugindo da vida real entrando na doce ficção dos livros e a mais doce ficção da bebida. Lia, escrevia, lutava boxe na rua e bebia. Bebia como se (e para que) a vida fosse terminar no próximo segundo.
Abandonou e retomou os estudos sem nunca se formar em jornalismo. Passou por inúmeros empregos temporários e em várias cidades americanas, sempre bebendo, brigando e escrevendo, não necessariamente nesta ordem. Se fixou como empregado dos Correios. Passava noites inteiras com o lápis em uma mão e o uísque na outra e o produto dessas noites era enviado à diversas publicações independentes e a grande maioria era recusada. De vez em quando chegava o pagamento de um ou outro texto, que virava mais bebida e mais outros tantos e tantos textos.
Barbara Frye, editora da revista Harlequin, começou a se corresponder com Buke, pois estava certa de que o cara era um gênio. Reza a lenda que a mulher teria dito que nenhum homem nunca se casaria com ela. “Eu me casarei”, respondeu Bukowski e casaram mesmo, se separando logo em seguida. Apesar de ter quase 40 anos, Buke era apenas um poeta meia boca, mas daí apareceu Henry Chinaski, seu alterego, personagem que narraria sua própria vida e experiências, criando um mito: o mito Charles Bukowski. De sua máquina de escrever saíram a vida nos becos, a repulsa, nojo, humor, paixão, melancolia, solidão e algumas sem-vergonhices. Buke pintava também, uns trecos horríveis, e nunca escondeu que o que escrevia era basicamente autobiográfico. Produziu mais de 50 livros e milhares de textos, cheios de corridas de cavalo, prostitutas e música erudita. A partir dos anos 80, Charles Bukowski firmou sua fama e tinha como atividade a leitura de seus textos e poesias em universidades e eventos culturais, onde não raro participava de escândalos e brigas com a plateia. Em 1987, Henry Chinaski foi interpretado por Mickey Rourke, no excelente filme Barfly, com Faye Dunaway.

Tem um monte de abobado que acha que o velho Hank (cada um chama ele de um jeito e para ele isso parecia ótimo!) é parte da geração beat. Buke não se encaixa nisso... O Velho Safado morreu em 9 de março de 1994, de leucemia, em seu túmulo está escrito “Don´t Try”. Para saber porquê, leia Charles Bukowski.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

- Contos de Fada


Há muitos anos, conversando com a Dafne, minha filha, vi que talvez um post assim fosse interessante. Vamos ver...
Hoje em dia, com tanto videogame, computador, celular, trecos que piscam luzes e fazem barulho, coisas que se mexem sozinhas, com tanta tecnologia, acho que ninguém mais conta historinhas para os filhos.  Fui criado ouvindo esses contos de fadas e passei isso para os meus filhos também, como a humanidade inteira faz há séculos, mas atualmente a maioria dos pais deixa essa tarefa para a Disney. “Hay quem goste dos olhos e quem goste das remela”, como diz um velho ditado aqui do sul e não vou entrar nesse mérito. O corcunda sabe o jeito que ele deita. Quero é postar algumas das verdadeiras histórias dos contos de fadas, que foram sendo alteradas através dos tempos.
Bom, pra começo de conversa, elas eram entretenimento para adultos e não foram criados para se contar às crianças. Tem uma certa proximidade com as fábulas, onde animais falam e outras coisas estranhas acontecem, histórias permeadas de entes mágicos, mas estes contos originalmente não tem nenhum ensinamento moral, em sua maioria. Charles Perrault, escritor do século XVII, foi o sujeito que “limpou” estes contos, colocando conselhos e lições. São dele os contos “clássicos” conhecidos. Já quem transformou estes contos em literatura infantil foram os mascates que vendiam artigos domésticos de um povoado para o outro e, entre eles, os “chapbooks” (ou cheep books, livros baratos, em inglês): Jacob e Wilhelm, os irmãos Grimm. Eles só apareceriam em 1812, com a maioria de seus textos copiados do Perrault. Uns vinte anos depois o poeta e romancista dinamarquês Hans Christian Andersen escreveu cerca de duzentos contos infantis, parte retirados da cultura popular, parte de sua própria lavra. Estes contos consagraram Andersen como o verdadeiro criador da literatura infantil. Depois vieram Lewis Carroll, com a Alice; Carlo Collodi, com o Pinóquio, J. M. Barrie com o Peter Pan e por aí vai... Mas, vamos aos três contos que escolhi:

BRANCA DE NEVE
Os irmãos Grimm ouviram a história das irmãs Jeannette e Amalie Hassenpflug e popularizaram o conto como Little Snow-White.
Aos sete anos, Branca de Neve provocou a ira da madrasta rainha por causa de sua beleza. Esta pede para que um caçador leve a criança para a floresta, que a mate e traga seu coração, pulmões e fígado para provar a morte. O caçador tem pena da menina e a deixa fugir, levando pra rainha os órgãos de um javali. Então a rainha come os órgãos (saboreando o que pensa ser as vísceras da pequena enteada)
A menina encontra a casa dos sete anões e eles a deixam ficar por ali, em troca de lavar, passar, costurar, limpar e arrumar a casa. A rainha descobre que ela ainda vive e tenta matar a garota em três visitas: Na primeira, ela leva um corpete de seda, e tenta matar apertando o corpete bem forte. Depois traz um pente envenenado e tenta matar penteando seus cabelos. Na terceira vez ela vem com a famosa maçã. Dessa vez os sete anões chegaram tarde demais e não conseguem acordar Branca de Neve. Ela continua uma criança linda e corada e eles a colocaram em uma cripta de vidro, sem coragem de enterrá-la.
Um dia um príncipe (pedófilo, claro: a guria tinha só sete anos!) viu a cripta com a menina e encheu o saco dos anões até ficar com ela. Seus empregados carregavam a cripta de um lado para o outro, mas um deles tropeçou e caiu, derrubando o caixão de vidro. Com a queda, Branca de Neve cuspiu o pedaço de maçã envenenada e voltou a viver.
O príncipe e Branca de Neve planejam então uma festa de casamento (viu só!) e convidam a madrasta má, porque é chegada a hora da vingança. A mulher se arruma e quando se olha no espelho mágico pergunta a ele sobre quem é a mais bela do reino e descobre que a menina está viva. Ela não dá muita bola e vai ao casamento. Quando vê que a noiva realmente é Branca de Neve, é tarde demais: eles colocam um par de sapatos de ferro na brasa, depois vestem o sapato na madrasta, a fazendo dançar até cair morta.

A BELA ADORMECIDA
Em 1634, o italiano Giambattista Basile escreveu o conto com o nome Sol, Lua e Tália (Sun, Moon, and Talia). Charles Perrault deu uma ajeitada na história e lançou A Bela Adormecida (Belle au bois Dormant), em 1697. Os irmãos Grimm também acharam o conto interessante e mudam o nome para Little Brier-Rose. O conto diz que uma farpa de linho entra sob a unha da princesa Tália e ela imediatamente cai adormecida, conforme uma profecia. O rei coloca sua filha em uma cadeira de veludo no palácio, tranca a porta e parte para sempre, tentando esquecer a sua dor. Algum tempo depois, outro rei que estava por ali caçando encontra a moça. Ele tenta acordá-la, mas, como não consegue, estupra a guria dormindo mesmo e vai embora. Nove meses depois Tália dá a luz aos gêmeos Sol e Lua, ainda sem acordar. Um dia um dos bebês suga o dedo da moça, não conseguindo encontrar o seio. Acaba extraindo a farpa e ela acorda. A guria viu que a vida dela mudou num piscar de olhos e se vê num mato sem cachorro com dois filhos pra criar.
Daí um dia, o rei estuprador se lembra dela e volta ao mesmo lugar, para ver se se diverte mais. A esposa do rei descobre e manda cozinhar as duas crianças para o marido jantar, mas o cozinheiro prepara cabritos no lugar. Então a rainha manda buscar Tália para lançá-la ao fogo, mas o rei chega e atira a própria esposa no lugar de Tália. Ele casa-se com Tália e vive com ela e seus filhos.

CHAPÉUZINHO VERMELHO
Na versão de Charles Perrault, Chapeuzinho é uma garotinha bem educada que acaba recebendo instruções falsas quando pergunta ao lobo sobre o caminho até a casa da vovó. No final, o lobo se dá bem e devora a menina, para que a moral da história seja a de que não se deve falar com estranhos.
Já na versão dos irmãos Grimm, o caçador chega na casa da vovó, vê o lobo dormindo e então usa uma tesoura para abrir a barriga do bicho e tirar as duas de dentro. Antes que o lobo acorde, a Chapeuzinho enche sua barriga com um monte de pedras pesadas. Assim que o lobo acorda e tenta correr, não consegue por causa do peso, então cai morto.